Porque a informação tem sido parca e os acontecimentos nos parecem relevantes, um local onde se reúnem documentos.

São tão necessários quanto bem-vindos todos os contributos, independentemente das posições ou perspectivas assumidas perante os factos, para faladagrecia@gmail.com.


terça-feira, 13 de janeiro de 2009

9 de Janeiro de 2009


Notícias:

Cops cut off and beat up small group of protestors
Massive Athens demo ends; people retreat in the university; air gun found by demonstrators; Patras and Thessaloniki demos set to start


Artigos:

Los centros de estudio, motor de la revuelta - Sakis Michanikos



Testemunhos / Artigos:

Dário de Atenas III

Dia 3

Terrorismo
Na Grécia, como em Portugal, a maior parte das pessoas que fazem limpezas trabalha para agências de trabalho temporário, que alugam mão-de-obra a outras empresas. Há um sindicato que organiza estes trabalhadores, a maioria mulheres: o sindicato ateniense de trabalhadores da limpeza e empregadas domésticas. Constantina Couneva é uma das mais militantes activistas desse sindicato – e portanto detestada pelos patrões do sector. Dois dias antes do Natal, foi atacada violentamente com ácido sulfúrico à entrada de casa. Não se identificaram ainda os agressores, mas toda a gente sabe que os empresários a odiavam. Diz-se que a justiça grega nada fará. Já passaram duas semanas e Constantina continua hospitalizada. Ao contrário do polícia alvejado, não teve milhares à porta, nem a solidariedade “consternada” do governo, nem a visita da Igreja, nem notícias nos jornais gregos nem meia página do Público.

“Fuck Mai 68. Fight Now!”
As assembleias gregas lembram as imagens do Maio francês. Não que não tenha havido outros Maios e outros PRECs. Mas Paris faz mais parte do imaginário colectivo, porque há mais registos e pôde ser vendido com a imagem romântica de uma revolução derrotada e com a saudade paternalista de quem, “no seu tempo”, acreditou que havia praia debaixo dos paralelos da rua. Acontece que a realidade é outra. O desemprego entre os jovens gregos (dos 15 aos 24 anos) era, no último semestre de 2008, de 21,4%, o maior da Europa. 70% dos jovens gregos que trabalham recebe menos que 750 euros por mês. O salário médio é hoje menor do que era em 1984, em termos relativos. E comparando os anos 80 com 2007, a distribuição de rendimento entre capital e trabalho desequilibrou-se em favor do primeiro: de 58% para 44%. Adianta pouco lembrar 68. A nossa geração, na Grécia ou em Portugal, é a primeira que sabe que viverá pior que os seus pais.
Provocações
Nas Assembleias de faculdade, que juntam centenas de estudantes em cada escola, um cartaz do KKE espalhado por todas as paredes tem a imagem de um jovem, de balas e de sangue. Poderia lembrar Alexis, o adolescente grego assassinado pela polícia. Mas não. É um cartaz sobre a Palestina. Nas quatro assembleias de hoje no Politécnico, foram aprovadas resoluções (da EAAK, da Aristeri Enotita e de outras correntes politicas estudantis) em que se apela à manifestação de amanhã, contra o Governo e a brutalidade policial. E em que se decide, sem que ninguém seja contra, pela participação na manif de sábado, contra o massacre em Gaza. O KKE está contra. Não concorda com as ocupações que ficaram decididas. Fará amanhã uma manifestação noutro local, só sobre a Palestina. E condenou a maioria das assembleias por não terem objectivos e por estarem a incentivar os “provocadores”. Da assembleia, no meio da desordem, alguém lhes perguntou: “e os que atiram pedras em Gaza, não são provocadores também?”
Ordem de Trabalhos
À porta da Assembleia Geral, pergunto a uma rapariga o que se está a discutir, qual é o tema. “Tudo. O que se discute é toda a sociedade”.
Zé Soeiro

via, http://canardlibertaire.blogspot.com/2009/01/dirio-de-atenas-iii.html



Diário de Atenas (director's cut).

Em Atenas nem todos os portuguese comrades são carinhas larocas que escrevem textos queridos e engraçados sobre as assembleias onde estiveram (ainda que o autor deste texto tenha sido já várias vezes descrito como portador de um semblante aristocrático).

Atena, homónima da cidade. Também ela tem um lado menos conhecido, mais sensual e sedutor.
"Batem as 12 horas de sábado, dia 3 de janeiro de 2009. Em frente à estação de comboio/metro de Petralona, bairro residencial próximo do centro de Atenas, pessoas com afinidades anarquistas vão-se juntando. Foi convocada uma manifestação de solidariedade com uma jovem trabalhadora e sindicalista do bairro de Petralona que foi vítima de uma agressão com ácido encomendada pelos seus patrões. A sua entidade patronal é uma empresa de limpeza contratada pela companhia que gere a linha de comboio/metro de Atenas, daí o local escolhido para o protesto. Por volta da uma da tarde, são cerca de três milhares, talvez um pouco menos, talvez um pouco mais, os manifestantes que se concentram no local designado e que iniciam a marcha de protesto. O percurso é simples e não passa por qualquer grande avenida ou praça de Atenas. Circunscreve-se ao bairro de Petralona, percorrendo as suas ruas e ruelas, mas sem nunca se afastar da estação. Entre os manifestantes predomina o preto das roupas, das bandeiras e das tintas com que se vão cobrindo as paredes do bairro com frases de luta. Não há muitas caras tapadas, apenas as dos que pintam e só quando existem câmaras através das quais é possível a sua identificação. Tirando nas bandeiras e os que são inscritos nas paredes, não se vêem símbolos anarquistas ou de qualquer outra espécie. O folclore iconográfico esquerdista não tem lugar entre este grupo que se desloca gritando palavras de ordem e acenando aos moradores que vêm à janela saudar os manifestantes. Petralona é um bairro de tradição de esquerda e um dos mais activos politicamente e talvez seja essa a razão que explica a afectividade com que os manifestantes anarquistas são recebidos. Às tantas, numa das ruas em que a manifestação seguia, pétalas de rosas são largadas por alguns moradores das suas varandas sobre os manifestantes que, por sua vez, respondem com palmas e sorrisos. Ao longo do trajecto pelo bairro houve apenas um momento de tensão. De um café, em cuja montra se escrevia qualquer coisa, saiu um homem, o proprietário talvez, com uma faca em riste, reclamando com os manifestantes. Imediatamente, alguns deles rodearam o homem, a ele se dirigindo com grande agressividade e veemência. Foi necessária a intervenção de outros manifestantes e de algumas pessoas que se encontravam no interior do café para que as coisas se acalmassem e o cortejo pudesse seguir o seu caminho em direcção à estação. Aqui chegados, as coisas mudaram rapidamente. Em poucos metros, passam a ser vários os koukoulofori, expressão que na Grécia se usa para designar o que no resto da Europa se vai chamando black block. A palavra grega tem uma romântica tradução literal para qualquer coisa como “encapuçados que se mexem”. Mas continuando. Passam a ser vários, quase todos, os manifestantes que se cobrem com capuzes, máscaras, gorros, cachecóis, etc.. As bandeiras passam para a frente e lajes do passeio são arrancadas e partidas, fornecendo armas de luta e arremesso aos manifestantes. Por esta altura, já as lojas fecharam e os donos e clientes se afastaram. Uma barricada é erguida numa das extremidades da rua que dá acesso à estação, sendo colocada entre os manifestantes e o corpo de intervenção da polícia que desde o início seguia de longe a manifestação mas que nesta altura se tentava aproximar. Feita a barricada e preparados que estão os manifestantes para enfrentar a polícia, passa-se à concretização da acção que os tinha reunido neste dia: o ataque à estação, propriedade da companhia que gere as linhas de comboio/metro de Atenas e onde tem actividade a empresa da trabalhadora atacada. A tensão é grande e às movimentações da polícia, respondem os manifestantes desafiando-a com palavras de revolta e um rufar sacado das bandeiras no chão, em contentores do lixo ou num gradeamento que ladeia a rua. Os manifestantes não recuam e a polícia não avança. Enquanto polícia e manifestantes se avaliam e controlam, um grupo destes entra na estação, munido de escadotes e outras ferramentas, para aí deixar a sua marca de protesto e revolta. A polícia, que consegue ver o grupo de manifestantes a entrar na estação, nada faz, limitando-se a aguentar a sua posição diante dos manifestantes e da barricada por estes levantada. Um confronto poderá ter consequências maiores e mais graves do que as que eventualmente resultarão do ataque à estação e a polícia parece fazer permanentemente essa avaliação. Em poucos minutos o grupo da estação está de regresso, manifestando aos que aguentaram o corpo policial o sentido do dever cumprido. A acção está concluída e agora resta seguir até ao local onde a manifestação deverá terminar, assegurando que ninguém fica para trás e é apanhado pela polícia que ainda se mantém à distância. Impressiona a capacidade de organização e o espírito de união dos manifestantes, condições que ajudam a explicar a dimensão e força da revolta que desde os primeiros dias de dezembro tem assolado a Grécia. Nesta parte final do percurso, as caras voltam a descobrir-se e as ferramentas usadas desaparecem sem disso se dar conta. A manifestação chega depois ao fim e os manifestantes rapidamente abandonam o espaço e se misturam entre os turistas e outras pessoas que circulam pelas movimentadas ruas de Atenas. Correu tudo conforme planeado. Não houve detenções e a estação ficou marcada por uma luta que veio para durar. Assim parece, pelo menos."

Party Program

http://www.spectrum.weblog.com.pt/


Cronologia e retrospectiva:


1 comentário: